terça-feira, 4 de agosto de 2009

FILMES

por Sílvio Fonseca

Cinemas inesquecíveis. Marapé, Ouro Verde, Campo Grande. Anos 60, quando eu era um menino.

Santos tinha umas 30 salas de cinema. Muitas nos bairros internos, outras tantas salas concentradas no Gonzaga e uma, duas no Boqueirão.

Mais tarde, os de bairro foram fechando e ficaram apenas aqueles da Praia. Hoje, há apenas um cinema de rua no Gonzaga, com diversas salas, e as salas múltiplas instaladas nos shopping centers.

Resistem, ainda, uma ou outra sala de espetáculos e filmes de caráter eróticos-pornográficos, na área do centro velho, mas essas não contam.

As matinês domingueiras eram mágicas. Minha paixão por elas era dividida apenas com as exibições do Santos F.C. e de Pelé na Vila Belmiro. Passava sempre duas”fitas”: um drama romântico ou comédia e, depois, um faroeste, precedidas por um capítulo de “seriado” (o precursor das novelas da “grobo"), que sempre terminava com o herói em situação de perigo de vida… a continuar na próxima semana. Isso fazia com que voltássemos no domingo seguinte, ávidos por saber o que acontecería.

Desses tempos, alguns filmes estão em minha lembrança até hoje, como “Tonka e o bravo comanche”, de Walt Disney, e “Marcelino ,pão e vinho”, com Pablito Calvo. Da adolescencia e da juventude outras películas marcam a memoria, como “Ao mestre com carinho”, com Sidney Poitier e “Romeu e Julieta”, de Fanco Zefirelli, da obra de Shakespeare.

Naqueles tempos, tão diferentes de hoje, os meninos queriam ter 18 anos para assistir aos filmes de adultos. Lembro de ter ido ver “Adulterio a la italiana“, pensando em cenas ‘quentes”. Foi uma decepção: achei a película seria e aborrecida.

Então chegou a época hollywoodiana, com seus heróis e filmes comerciais: “Tubarão”, “Super-Homem“, “Grease”, “O Exorcista”, “Indiana Jones” etc. Não era bem o cinema que eu gostava.

Adulto, conheci o cinema europeu e seus filmes magníficos, como “Ladrões de Bicicletas”, de Vittorio de Sicca, “Teorema”, de Pasolini, “La Belle de Jour”, de Luís Buñuel, com Catherine Deneuve, as comédias do grupo inglês Monty Python e do italiano Lando Buzzanca e muitas outras.

Desde há uns 15 anos, fui conquistado pelo cinema español, em especial o de Pedro Almodóvar. Creio ter assistido a quase todos os seus filmes: “Tacones”, “Volver”, “Hable con ella”, “Tudo sobre minha mãe”, “Carne trémula”, “Kika’, “Átame”, “Mulheres à beira de um ataque de nervos”. De todos, o que mais gostei foi “A flor de meu segredo”: simples, bem a seu estilo.
É a história de uma escritora de novelas, Leo (que as assina como Amanda Gris), que enfrenta dificuldades no casamento com Paco, oficial do exército servindo junto às tropas da ONU na guerra da Bósnia. Depois de tentar, de todos os modos, manter seu casamento, conhece Angel, editor de um jornal madrilenho e…

Bem, não vou contar a história. Quem não assistiu, que assista. O filme é estrelado por Marisa Paredes (Leo), magnífica como sempre, e pela impagável Rossi de Palma (Rosa, irmã de Leo).
Concluo: sempre gostei de cinema, mas apenas como diversão. Sem nenhuma pretensão intelectual.

quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009

Santos descobre o cinema

A cidade de Santos passava por um período de intensas transformações urbanas no final do século XIX. Para escoar a produção cafeeira paulista, inicialmente são realizados investimentos para o transporte do produto, com a construção da estrada de ferro São Paulo Railway, em 1867. Mais tarde, a cidade receberia novo impulso de desenvolvimento com a criação da Companhia Docas de Santos, empresa que teria a incumbência de adequar e modernizar o porto às crescentes demandas de exportação.

Em poucos anos, a cidade adquire importância estratégica para o desenvolvimento econômico do País. Empresas do setor cafeeiro e de exportação instalam seus escritórios na cidade. Obras de saneamento, portuárias, e urbanísticas, atraem também um grande número de trabalhadores. Ainda que com uma grande taxa de mortalidade devido às freqüentes e variadas epidemias, a população cresce.

As opções de lazer e diversão para santistas e turistas são muitas. No Centro, o Teatro Guarany, os clubes sociais, como o XV e o extinto Éden Santista, além de um passeio pelo Monte Serrat, local adequado para se apreciar a bela vista aérea da região e da Serra de Paranapiacaba, são as principais atrações. Diferente de nossos dias, a zona continental da Cidade também recebia um grande fluxo de pessoas, que as margens do rio Diana faziam passeios e piqueniques.

O turismo e o lazer na orla da praia têm também origem nesse período. Surgem os clubes de regatas na Ponta da Praia, as primeiras cabines para troca de vestuário e banho, para os adeptos a mergulho no mar, sempre próximos aos hotéis Parque Balneário, no Gonzaga, e Internacional, no bairro do José Menino. Temos ainda o bar do Gonzaga, primeiro estabelecimento comercial da beira-mar e que daria nome ao bairro que ali se desenvolveria.

Dentro desse cenário urbano, a Companhia Viação Paulista instala no bairro do Boqueirão o Miramar, um moderno bar com iluminação elétrica e ampla área verde, onde regularmente se promoviam bailes e exposições sobre as grandes novidades e descobertas do final do século. É neste local, que em 7 de fevereiro de 1897, o evento promovido pelos senhores Fernandes e Queiroz daria início a trajetória da exibição cinematográfica em Santos.

Tal como em São Paulo, o evento recebeu aqui o nome de Photographia Animada, permanecendo em temporada até o dia 25 do mesmo mês, segundo os anúncios publicados no jornal “Diário de Santos”. Em sua edição de sábado, 6 de fevereiro, esse mesmo jornal dá destaque ao evento em suas páginas. Vejamos: “No domingo toda a gente deve ir ao Miramar, onde teremos uma novidade capaz de assombrar a quem lá for. Pois agora, o senhor Fernandes vae opor à celebridade norte-americana uma conquista notabilíssima da progressista Alemanha”.

Se por um lado, não existem informações sobre o programa cinematográfico exibido e o proprietário do equipamento, o anúncio deixa escapar a procedência alemã do equipamento. Sabemos também, que os senhores Fernandes e Queiroz são dois promotores de eventos da Cidade, não tendo informações sobre o pioneirismo cinematográfico deles em outras cidades brasileiras.

Não poderíamos deixar de observar que, além do evento santista ter o mesmo nome do realizado em São Paulo, o pioneiro do cinema paulistano, Georges Renouleau, anunciava nos jornais do período a instalação de um ateliê fotográfico em Santos. Diga-se de passagem, desde 1892, registramos a presença de Renouleau na Cidade, portanto, não era desconhecido dos santistas. Outra curiosidade é o fato de Renouleau, no ano anterior, ter realizado as primeiras projeções em Porto Alegre, grande reduto de imigrantes alemães.

Se é incerta a participação de Renouleau nas primeiras projeções cinematográficas santistas, sabemos que a Photographia Animada, pouco depois da temporada no Miramar, iniciaria suas atividades no Centro. O jornal A Tribuna, de 28 de fevereiro, publicaria a seguinte matéria: “Os senhores Fernandes e Queiroz, que nestes últimos tempos tem exibido no Miramar a photographia animada, com boa concorrência, por tornar-se verdadeira maravilha, resolveram, para comodidade do público, tranferir-se para os baixos da Brasserie La Bouser, de Ch & Cult, na rua XV de Novembro, onde esteve a repartição do Correio. Tencionam funcionar por 8 a 10 dias nesse local. As pessoas que ainda não tiveram a ocasião de apreciar a photographia animada não devem perder essa rara e bela oportunidade”.

Encerradas essa temporada, o cinema só voltaria a ser notícia, meses depois, no final de junho. A iniciativa caberia novamente aos senhores Fernandes e Queiroz que em parceria com o Prof. Kij, mostrariam ao público santista a apresentação da photographia animada intercalada com a audição do microphonographo. As projeções prosseguiriam até o mês de julho, sendo as últimas realizadas no ano de 1897.

Representante dos equipamentos de Edison no Brasil, o prof. Kij havia meses antes, realizado em São Paulo, uma das primeiras tentativas de projeções sonoras, exibindo simultaneamente o Vitascope (projetor) com o microphonographo. Segundo o anúncio publicado nos jornais, isso parece não ter ocorrido em Santos.

Como no restante do País, muitas são as dúvidas e lacunas sobre a história inicial do cinema em Santos. Infelizmente, devido à má conservação e a não restauração do acervo das hemerotecas locais, perdemos parte significativa das fontes de pesquisa desse período, restando apenas os trabalhos de outros pesquisadores como referência. Até o ano de 1915, teremos como única fonte os trabalhos realizados por Olao Rodrigues, Pedro Bandeira Júnior e José da Costa Ramos. É a partir deles que contaremos os próximos dois capítulos desse livro.

Postado em 12 de janeiro, de 2009.

Paulo Renato Alves

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quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

Primeiras sessões no mundo e no Brasil

Se bem é verdade, que muitas outras experiências cinematográficas foram realizadas antes mesmo das históricas sessões promovidas pelos irmãos Lumiére, no Grand Café, em Paris, foi o êxito alcançado pelos franceses que determinou a difusão do cinema por todo o mundo.

Precedendo qualquer pretensão artística, o cinema tinha como grande atrativo de público a descoberta científica em si, ou seja, a possibilidade de ver a exibição de imagens em movimento. Este também era o principal motivo pelo qual os jornais da época anunciavam o evento dando tanto destaque ao nome do aparelho utilizado na projeção.

No Brasil, não seria diferente. Em 8 de julho de 1896, a imprensa carioca publicaria informações sobre um aparelho de nome exótico, que chegara ao Rio de Janeiro e iniciaria suas atividades na rua do Ouvidor. O Ominiógrapho ficaria em temporada somente no mês de julho, sendo exibido intercaladamente com o phonógrapho, equipamento cujo atributo era o de reproduzir mecanicamente o som. Contudo, o noticiário não deixa pistas sobre o responsável pelo evento, o proprietário e origem do Ominiógrapho, e os filmes exibidos em nossas pioneiras projeções.

Pouco depois de debutar no Rio de Janeiro, o cinema chegaria à cidade de São Paulo através do fotógrafo francês Georges Renouleau. Em 7 de agosto, e com o nome de Photographia Animada, o evento seria divulgado para a platéia paulistana. Em novembro desse mesmo ano, já se poderia encontrar o fotógrafo francês em Porto Alegre, sendo ao lado de Francisco de Paola e M. J. Davis, um dos pioneiros do cinema gaúcho.

A partir de 1897, multiplicam-se os equipamentos de projeção em atividades no eixo Rio – São Paulo. Contrariando o caráter itinerante da exibição cinematográfica do período, o italiano Paschoal Segreto, em parceria com José Roberto da Cunha Salles, fixa no “Salão de Novidades”, o primeiro espaço regular de cinema.

É também no ano de 1897, que José Roberto da Cunha Salles registra o primeiro filme brasileiro na Seção de Privilégios Industriais do Ministério da Agricultura. Pouco depois, em fevereiro do ano seguinte, seria a vez de Afonso Segreto, irmão caçula de Paschoal, realizar “Fortaleza e Navios de Guerra na Baía do Rio de Janeiro”, a bordo de um navio quando em regresso da Europa. Seu lançamento ocorreria, é claro, no “Salão de Novidades”.

Se a produção de filmes alcança maior plenitude somente no início do século XX, onde teríamos o que o historiador Vicente de Paula Araújo denominou de “A bela época do cinema brasileiro”, sua exibição era nos primeiros anos um indicativo de possibilidades para um bom negócio. Na busca de novos públicos e maiores lucros, seus empresários expandem as atividades para diversas cidades de grande e de médio porte espalhadas pelo País.

Muitos foram os que se lançaram nessa aventura, mas seria injusto não destacar as contribuições feitas por outros imigrantes como os espanhóis Enrique Moya e Francisco Serrador, o italiano Vittorio di Maio, e o português Germano Alves, responsáveis pelo pioneirismo cinematográfico em diversas cidades brasileiras.

Porém, ainda que com todo esse empreendedorismo, o desenvolvimento de um mercado ainda se encontrava refém da grave crise econômica e do pífio acervo de filmes em circulação no País. A experiência do “Salão de Novidades” não seria reproduzida por outros exibidores e as salas de cinema somente se tornariam realidade anos mais tarde.

Muitas são as histórias dos primórdios do cinema brasileiro. A literatura do assunto é extensa e conta com memoráveis obras de Paulo Emílio Salles de Oliveira, Vicente de Paula Araújo, Fernão Ramos, Inimá Simões, Jurandir Noronha, José Inácio de Melo e Souza, Máximo Barro, e de muitos outros pesquisadores que com seus estudos ajudaram a reconstituir os primeiros anos de nossa trajetória cinematográfica.

Em Santos o assunto também foi objeto de estudo de diversos historiadores e pesquisadores. Destacam-se os trabalhos de Hernani Corrêa de Moraes em seu livro “Coletânea do Cinema Mundo – Ano 1920”, as investigações históricas de Olao Rodrigues, Pedro Bandeira, José da Costa Ramos, as apaixonantes crônicas do poeta Narciso Andrade e da jornalista Lydia Federici, além do relevante trabalho apresentado pelo historiador paulistano Máximo Barro, que ao reconstruir a história do cinema em nosso Estado, aborda também o período inicial cinema santista.

Desvendar as aventuras e desventuras do cinema em Santos, contextualizando-o com o desenvolvimento da própria cidade e do mercado de exibição no País, foi o aspecto motivador do presente trabalho. Contudo, não poderia deixar de referendar que seu principal objetivo é o de estimular novas pesquisas, na certeza de que muito ainda se tem por investigar e descobrir sobre o assunto. Por fim, espero também provocar a memória de nossos antigos cinéfilos, que se embarcarem nessa leitura encontrarão um pouco da história de nossa Cidade e de suas próprias vidas. Aos que se animarem para tal tarefa, boa leitura!

Postado em 29 de janeiro de 2009

Paulo Renato Alves

sexta-feira, 9 de janeiro de 2009

Indicadores Culturais: o mercado de exibição cinematográfica em Santos no ano de 2006

I - Introdução
As diversas matérias publicadas no jornal A Tribuna revelando questionamentos do público santista sobre a qualidade da programação de nossos cinemas, motivaram-me a fazer uma pesquisa sobre o assunto. O objetivo do trabalho concentrava-se inicialmente em levantar os filmes exibidos na cidade, o sistema de projeção adotado pelos exibidores, a nacionalidade e o ano de produção dos títulos, bem como o tempo que permaneciam em cartaz. Obtidas tais informações, o passo seguinte seria o de pesquisar os filmes exibidos nos cinemas brasileiros para promover a comparação com o mercado santista, observando o que foi exibido e principalmente, o que deixou de ser exibido nas telas santistas. Por fim, a proposta compreendia a contextualização do mercado santista entre os exibidores nacionais com o objetivo de estabelecer parâmetros de comparação com outras cidades de igual ou maior porte.

Para iniciar o estudo do mercado santista adotei como referência as edições diárias do jornal A Tribuna. Já as exibições em território nacional tiveram como fonte a revista o Banco de Dados – Data Base Brasil 2006, software desenvolvido pelo site Filme B, e no caso específico de São Paulo, a revista Veja São Paulo. De posse dessas informações seria necessário sistematizar a pesquisa resolvendo problemas metodológicos que surgiriam no caminho. A pesquisa compreendeu também o circuito alternativo de exibição através do levantamento sobre as atividades promovidas regularmente pelo Cineclube Lanterna Mágica, Sesi, MISS e Cineclube Aliança Francesa, e esporadicamente pela Cinemateca de Santos. O leitor atento poderá ainda observar que embora a referência comparativa de mercados seja o ano de 2006, relaciono os filmes que chegaram aos cinemas santistas no ano de 2007. Enfim, após alguns meses de intenso trabalho conclui a pesquisa que apresento resumidamente a seguir.

II - O cinema em Santos.

Com a inauguração do Espaço Unibanco de Cinema em dezembro de 2006, o mercado santista de cinema passaria a contar com 19 salas de que disponibilizariam um total de 4024 poltronas. A rede Cinemark apresenta-se como o maior exibidor da cidade com 10 salas de projeção e 2.339 poltronas. O tradicional Cine Roxy vem a seguir com 5 salas e 1.305 poltronas, e o Espaço Unibanco de Cinema com 3 salas e 332 poltronas. Acrescenta-se a essas empresas de exibição, o Cine Arte Posto 4 mantido pela Prefeitura Municipal e que possui apenas 48 lugares.

Essas 19 salas realizaram 24.966 sessões exibindo 234 filmes, dos quais 205 estréias, 12 filmes de 2005 que permaneceram em cartaz ou foram reexibidos em 2006, 17 títulos que integraram o Festival Curta Santos e o Ciclo de Humor à Francesa promovido pelo Cine Arte Posto 4 e a Mostra Fellini que marcou a programação inicial do Espaço Unibanco de Cinema. O ano de 2006 marcaria ainda a estréia do cinema digital na cidade com a projeção de “A Odisséia Musical de Gilberto Mendes” nas telas do Cine Roxy.

A rede Cinemark foi responsável pela exibição de 160 filmes distribuídos em 15.112 sessões, respondendo por 60,5% das projeções realizadas na cidade. O Cine Roxy foi o nosso segundo maior exibidor com 8.599 sessões e um montante de 139 filmes, o que significa 34,42% do mercado local. Já o Cine Arte Posto 4 projetou 60 filmes em 1056 sessões, o que corresponde a 4,22%, seguido pelo Espaço Unibanco de Cinema com 10 filmes apresentados em 202 sessões, ou 0,80% do total de projeções das salas santistas.

Em busca de melhores bilheterias, as salas do Cinemark e do Roxy repetiram o mesmo programa cinematográfico nada menos que 129 vezes. Se por um lado o público teve a comodidade para escolher a sala de sua preferência, por outro deixou de ter acesso a um grande número de filmes lançados no mercado nacional. Em contrapartida, o Cine Arte apresentou-se na condição de único exibidor da cidade em 43 filmes. Quanto ao Espaço Unibanco, a exclusividade de exibição esteve presente em apenas 5 filmes.

O Cine Arte Posto 4 também se destacou por privilegiar em sua programação a diversidade de cinematografias do mundo. Com isso, o público santista teve a opção de assistir a filmes franceses, argentinos, iranianos, dinamarqueses e de vários outros países. Em suma, títulos que dificilmente conseguiram espaço para exibição nas salas comerciais da cidade. No que se refere ao cinema brasileiro, incluído o programa do festival Curta Santos, foram exibidos nesta sala 17 filmes, o que vale dizer 28,3% de sua grade de programação.

Quanto ao perfil de programação o Cinemark apresentou 109 produções americanas (68,12%) e 20 filmes brasileiros (12,5%). Por sua vez, as salas do Cine Roxy apresentaram um total de 96 filmes americanos (69,06%) e 13 títulos nacionais (9,35%) entre os quais o lançamento nacional do filme “Cafundó” e a estréia da projeção digital com a exibição do documentário “A Odisséia Musical de Gilberto Mendes”. O Espaço Unibanco projetou um filme de origem espanhola e 4 co-produções diversas entre seus lançamentos.

No computo geral, o cinema americano, entre produções e co-produções, ocupou 67,28% do mercado exibidor santista. O cinema brasileiro teve participação nas telas em 14,74% dos filmes exibidos, considerando nesse percentual o filme “Família Rodante” do diretor argentino Pablo Trapero feito em co-produção com o Brasil e a Espanha. Tendo como maior porta de entrada o Cine Arte Posto 4, o cinema francês é a terceira cinematografia mais exibida na cidade com 10,59% do total de filmes.

Entre os dez filmes de maior permanência nas telas da cidade tivemos a presença de apenas uma produção nacional. O recordista de exibições do ano foi o filme “A Era do Gelo” curiosamente dirigido pelo brasileiro Carlos Saldanha, que foi projetado nada menos que 880 vezes nas telas do Cinemark e do Cine Roxy.

III - Dados Comparativos de Programação

O circuito brasileiro de cinema teve um montante de 400 filmes exibidos no ano de 2006, considerando aqui tanto os títulos de lançamentos como os filmes de 2005 que se mantiveram em cartaz até o ano seguinte. Contudo, somente 212 puderam ser apreciados pelo público santista em 2006. Outros 21 filmes chegariam aos nossos cinemas em 2007. Por outro lado, 10 filmes apreciados na cidade em 2005 permaneceram em exibição nos cinemas do país em 2006. Outra observação importante a ser feita é de que 21 títulos chegaram a Santos no formato digital, sendo apenas um deles no ano de 2006, o que denota um crescimento substancial da projeção digitalizada em 2007.

De posse dessas informações, concluímos que 132 filmes projetados nas salas brasileiras em 2006 permanecem inéditos em Santos até final de 2007, sendo 35 deles produções nacionais. Entre os diretores consagrados que não chegaram aos cinemas santistas destacam-se os nomes de Werner Herzog, Wim Wenders, Manoel de Oliveira, Amos Gitai, Ken Loach, Stephen Frears, Jim Jamursh, Gianni Amélio, Roberto Faenza, Samira Malkmalbaf, Costa Gavras e Pedro Almodóvar com seu filme “Que fiz eu para merecer isto?” datado de 1984, lançado em vídeo, mas inédito nos cinemas. Entre os cineastas brasileiros ficaram inéditos Nelson Pereira dos Santos, Ruy Guerra, Eduardo Coutinho, Carlos Reichembach, Sylvio Back e João Batista de Andrade.

IV - Os cinemas santistas no mercado nacional

Segundo informações contidas no Data Base Brasil 2006, Santos ocupa a 15ª posição tanto em número de salas como em bilheteria, tendo o mercado santista arrecadado para seus cofres a quantia de R$ 7.036.499,00. Em público, a cidade fica com a 14ª posição, atraindo para o escurinho do cinema um total de 969.738 espectadores. Já o valor médio de R$ 7,26 por ingresso torna o nosso programa cinematográfico o 13º mais caro do país. Merece destaque também o fato de nossos exibidores venderem 2, 318 ingressos por habitante, o que nos coloca na 3ª posição do ranking nacional. Outro dado curioso é que de acordo com os números do Data Base Brasil e dos números de sessões que pesquisei, a média de público por sessão é de 38,84 pessoas por sessão.

Se considerarmos a relação número de habitantes por sala de cinema, a cidade é a 5ª mais bem equipada do país tendo uma sala de cinema para cada grupo de 22.020 pessoas, ou seja, uma média de 104 habitantes por poltrona disponível. Outra informação relevante é o fato de Santos ter um número de salas superior a 10 estados, ainda que isso seja traduzido em somente 1,118% do total de público presente nos cinemas brasileiros. Em suma, apesar de pequeno, o mercado de exibição santista só é superado por 14 outros municípios brasileiros, todos com população superior a Santos. Nada mal se tivermos como parâmetro o censo populacional do IBGE, que nos situa na 42ª colocação em número de habitantes.

V - Conclusão

Considerando o fato de boa parte dos filmes inéditos em nossa cidade terem um número reduzido de cópias, geralmente insuficientes para atender a demanda do mercado nacional de cinema, as salas santistas deixaram de exibir no biênio 2006/2007, um montante de 132 filmes lançados e exibidos no país em 2006.Seja pelas dificuldades citadas ou mesmo pela baixa rentabilidade de alguns filmes, o Cinemark e o Roxy optaram por grades de programação muito semelhantes, privilegiando a exibição de um mesmo título em suas salas. No caso de filmes com grande apelo de público foram disponibilizadas mais de uma sala por cada um desses exibidores. Nada de surpreendente, já que também se tratam de empreendimentos comerciais com suas despesas correntes e a busca do lucro em seus fins.

Por sua vez, o Cine Arte Posto 4 diferenciou-se por oferecer em sua grade de programação filmes de nacionalidades diversas, geralmente com boas referências da crítica e poucos atrativos comerciais. Como a presente análise é referente ao ano de 2006, o Espaço Unibanco de Cinema teve poucas semanas de funcionamento nesse ano o que torna precipitado qualquer avaliação sobre a programação que oferecerá. Ao público santista resta a expectativa que a entrada desse novo exibidor possibilite uma maior diversidade de títulos exibidos na cidade e diminua a lacuna de filmes inéditos em Santos.

Outro dado que merece observação é a média de 38,84 pessoas por sessão. Teríamos de fato essa elevada média de público por sessão? Ainda que alguns filmes apresentem tenham mais público e permaneçam mais tempo em exibição, parece-me por demais elevado esse número, não sendo essa a realidade que se pode observar indo ao cinema. Para as lamentações dos cinéfilos santistas de que muitos filmes acabam não sendo exibidos na cidade (os chamados filmes de arte), ficam as seguintes perguntas: 1) Teríamos público em quantidade suficiente para pagar os custos decorrentes da vinda desses filmes para a cidade? 2) A qualidade e diversidade da programação veiculada no Cine Arte Posto 4 poderia ser mantida sem os subsídios do poder público municipal? 3) Além do Cineclube Lanterna Mágica que realiza regularmente atividades voltadas para a formação de público, que outras instituições cinematográficas da cidade possuem essa preocupação? 4) Quem poderia capitanear com legitimidade alguns encontros entre exibidores, cinéfilos e poder público para debater esse tão polêmico assunto e estudar possibilidades que viabilizem uma maior diversidade de filmes nas salas santistas?

Enfim, espero poder em breve apresentar a pesquisa referente ao ano de 2007 para saber o que mudou com a entrada das 3 salas do Espaço Unibanco, que índice de crescimento teve o cinema digital na cidade, que filmes foram exibidos e quais ficaram inéditos. Quem tiver interesse, aguarde.

Paulo Renato Alves

quinta-feira, 8 de janeiro de 2009

A Cinelândia Santista e os novos cinemas de bairro

Com o início dos anos 50, o bairro do Gonzaga passa a ocupar um lugar privilegiado no mercado de exibição local, abrigando em sua geografia as salas mais confortáveis e luxuosas, as melhores bilheterias e os principais filmes em lançamento. A Empresa Cinemas de Santos Ltda detém as três salas em funcionamento no bairro, com as salas do Cine Roxy, do Cine Atlântico e do Cine Gonzaga. A empresa possuía ainda mais 8 salas espalhadas em bairros da cidade e o Cine Anchieta em São Vicente. A concorrente Cine-Theatral contava com o Coliseu e o Guarany, no Centro; o Cine D. Pedro II e o Popular, localizados no bairro do Macuco; e o Cine Campo Grande, situado em bairro do mesmo nome.

O cinema, o futebol e o banho de mar são as principais opções de lazer e diversão para os moradores da cidade e turistas. A cidade recebia um número crescente de turistas, sobretudo depois da construção da Via Anchieta no final dos anos 40. A cidade passa por um boom imobiliário, modificando a paisagem urbana com a derrubada de antigos casarões da orla da praia para a construção de prédios. Nesse primeiro grande momento de verticalização da cidade surgem os apartamentos modelo kitinete, de grande procura por moradores da capital e interior do Estado.

A desativação dos cassinos feita no governo Dutra, o número reduzido de espetáculos teatrais e musicais, são fatores que contribuem para a grande quantidade de público nas salas e a rentabilidade das salas, possibilitando novos investimentos no ramo exibidor. Dentro dessa lógica em 1951, o antigo Cine Miramar é demolido para dar lugar a um novo e moderno cinema. Em 15 de maio de 52, o Cine Caiçara começaria suas atividades. Anunciado pomposamente como uma das melhores salas do País, contava com um total de 1800 poltronas na cor verde e fina tapeçaria. A cabine de projeção era a única da cidade a dispor de três projetores, todos da marca Simplex X-L. A entrada era composta de um amplo hall e as salas de espera decoradas com painéis e pastilhas brilhantes, jardim com flores tropicais, dispondo também de cabines telefônicas e bebedouros com água gelada.

O Cine Caiçara era mais uma parceria da Cinemas de Santos Ltda com o construtor e banqueiro Domingos Fernandes Alonso, proprietário do Banco Novo Mundo e também responsável pelas obras dos cines Atlântico e Gonzaga. No programa de estréia o lançamento do filme “Sinfonia em Paris”, musical ganhador de 9 estatuetas da Academia de Hollywood, produzido pela Metro, com direção de Vincente Minneli e estrelado por Gene Kelly e Oscar Levant. Trata-se da primeira produção musical a conquistar tantos prêmios, inclusive o de melhor filme. Com lotação esgotada a sessão inaugural tem sua arrecadação feita para a instituição “Gota de Leite”.

Mostrando espírito empreendedor a empresa Cinemas de Santos já havia instalado no ano anterior, novos equipamentos de projeção no Cine Paramount e inaugurado o Cine Macuco. A pioneira sessão realizada em 13 de outubro exibiria programação dupla com os filmes “Dois Fantasmas Vivos” da dupla cômica O Gordo e o Magro e “Os Desafios de Lassie” com direção de Richard Thorpe. Curiosamente, o bairro do Macuco é o que concentra na cidade o maior número de salas, contando além do recém inaugurado Cine Macuco, os cinemas D. Pedro II, São José, Santo Antonio e Popular.

Se o mercado de exibição cinematográfica em Santos mostrava-se em ascensão, o nacional já dava indícios de decadência. Contrariamente a década de 40, o crescimento de público nos cinemas tinha índices inferiores ao do crescimento da população. Esse importante dado fornecido pelo SEADE (ex-Departamento de Estatísticas do Estado de São Paulo) seria o primeiro sinal de uma crise que se instalaria no setor de exibição nos anos 60 e que acarretaria no fechamento de muitas salas em todo o território nacional.

E a cidade teria mais um cinema de bairro em setembro de 1952 com a abertura do Cine Marapé. Tratava-se do primeiro cinema desse bairro, situado na Avenida Pinheiro Machado, 677. A empresa Cinemas de Santos Ltda programaria para a inauguração dessa sala os filmes “Os Filhos dos Mosqueteiros”, produção da RKO sobre o clássico livro de Alexandre Dumas, com Cornel Wilde e Maureen O’hara no elenco e direção de Lewis Allen e “Você já foi a Bahia?, primeiro filme a mesclar atores com personagens animados. Assim ao lado de Pato Donald, Zé Carioca e Panchito, temos a atriz cantora Aurora Miranda, Dora Luz e Carmen Molina. O repertório musical incluía ainda músicas de Ari Barroso e Dorival Caymmi.

A cidade passava por um momento de transição política. A autonomia perdida em 1937, durante o Estado Novo de Getúlio Vargas é devolvida em 1953, curiosamente pelo próprio Getúlio Vargas, agora eleito democraticamente no início dos anos 50. Retomada a autonomia, Santos elege como prefeito o Dr. Antonio Feliciano. Enquanto reconquistava seus direitos democráticos, mais 3 espaços de exibição surgem na cidade. O circuito santista é ainda ampliado com a transformação do antigo teatro do Centro Português em cinema. Em 19 de março, o Cine Centro Português começa suas atividades com a projeção do filme italiano “Coração Ingrato”, dirigido por Guido Brignone e com Carla Del Poggio no papel principal.

Tentando contrapor os investimentos da empresa Cinemas de Santos e na tentativa de revitalizar o Cine Popular, a empresa Cine Theatral investe em novas instalações desse cinema, reabrindo-o posteriormente com o nome de Cine Cacique. A estréia dessa sala aconteceria com os filmes “O Conde de Monte Cristo”, filme também em cartaz no Cine Coliseu e com direção de Rowland V. Lee, e “O Homem do Planeta X”, do diretor Edgard Ulmer.

No entanto, o maior investimento da empresa dirigida pela família Freixo seria a inauguração do Cine Iporanga, a primeira da empresa Cine Theatral no bairro do Gonzaga, região predileta do público cinematográfico santista. O Cine Iporanga faz a sua primeira projeção cinematográfica com o filme “Retrato de Jennifer”, produzido por David Selznick, dirigido por William Dieterle e estrelado pela atriz Jennifer Jones.

A nova sala do Gonzaga passa a ser o principal lançador de filmes da empresa Cine-Theatral. O cinema apresentava uma decoração composta por painéis artísticos que ao apagar das luzes se transformam em símbolos do zodíaco, salão de espera com luxuoso bar e televisão e plantas tropicais colocadas sobre adornos de mosaicos coloridos.

Bem diferente ao crescimento do mercado de exibição, a produção cinematográfica brasileira começa a passar por um período de intensa crise. Passada a euforia das primeiras produções realizadas pela Vera Cruz, surgida em fins dos anos 40 com o intuito de industrializar o cinema no País, esta produtora cinematográfica passa por intervenção do Banespa, seu maior credor. Dos 18 filmes de longa-metragem rodados pela Empresa, somente o “Cangaceiro” e “Sinhá Moça” conseguem obter resultados satisfatórios em bilheteria. Ainda assim, o filme “Cangaceiro”, primeiro longa-metragem do diretor Lima Barreto, nada rendeu para a Vera Cruz, já que o capital investido para o filme foi realizado pela Colúmbia Pictures tendo como contrapartida os direitos de exploração do filme no mercado externo.

O fracasso econômico da Vera Cruz contrasta com o sucesso de alguns de seus filmes. O diretor Lima Barreto, por exemplo, ganhou com “Santuário” o prêmio de melhor curta-metragem do Festival de Veneza, assim como “O Cangaceiro” conquistou o Prêmio Internacional de Filmes de Aventura e Menção Especial para Música. A produtora foi premiada ainda no Festival de Punta Del Leste com o filme “Caiçara” de Adolfo Celi e conquistou o Leão de Bronze no Festival de Veneza com o filme “Sinhá Moça”, dirigida por Tom Payne.

Enquanto a tentativa de industrialização cinematográfica no País sofre um grande revés, as salas de exibição passam por um intenso período de inovações tecnológicas. A sonorização das salas ganha melhoria com a chegada do som estereofônico e a imagem passa a ser projetada no sistema cinemascope tornando as telas mais largas, modificando e ampliando a distribuição da imagem na tela.

Esse novo sistema inventado pela 20º Th Century Fox é lançado com estrondosa divulgação em setembro de 1953 no Chinese Theatre de Hollywood. O exibidor cinematográfico americano já se ressentia por esse período dos efeitos da popularização da televisão acarretando em uma substancial perda de público. Pouco antes, já havia sido criado o Cinerama, sistema que também produziria a impressão de profundidade mediante o uso de três projetores funcionando concomitantemente. Porém, a relação custo/benefício desse sistema inviabilizaria sua apropriação pelos exibidores.No Brasil, a estréia do cinemascope ocorre no ano seguinte, nas salas do Cine Palácio no Rio de Janeiro e do Cine República em São Paulo. Já em Santos, a primeira sala a contar com esse novo sistema de projeção foi o Cine Caiçara. O primeiro filme produzido e exibido em cinemascope foi “O Manto Sagrado” do diretor Henry Koster. Posteriormente foram realizados “Como agarrar um milionário” e “Rochedos da morte”. O sucesso alcançado pela Fox com esses filmes levou outras produtoras americanas a aderirem ao sistema, surgindo então o Superscope, o Metroscope e a Warnerscope.

Se a sofisticação tecnológica mostra-se presente nas produções americanas, o cinema brasileiro distancia-se de um modelo industrial. “Rio 40º” do iniciante cineasta Nélson Pereira dos Santos, manifesta as primeiras características que estruturariam o momento do Cinema Novo, com temáticos populares e um sistema de produção alternativo e cooperativado. O filme enfrentaria diversos problemas com a censura sendo liberado para o circuito exibidor apenas em 1956, um ano depois de realizado.Por esse período os exibidores começam a sentir os primeiros efeitos da diminuição de público nas salas de cinema, principalmente as localizadas em bairros e no Centro. Já com evidentes sinais de decadência, a Empresa Cinemas de Santos encerra as atividades de dois espaços de exibição. Em dezembro de 1956, o Cine Astor e o Cine São Bento, o primeiro situado no bairro da Vila Nova e o segundo na região central da cidade. As duas salas tinham como características não serem espaços lançadores de filmes, sendo que o Cine São Bento, reinaugurado dois anos antes, já se dedicava exclusivamente a exibição de filmes destinados exclusivamente ao público masculino. “Veneno Branco” filme que encerrou as atividades desta sala, anunciava nos jornais tratar-se de uma “Sessão Exclusiva para homens” e “Rigorosamente proibido para menores de 18 anos”.

Ao mesmo tempo em que fecha dois de seus espaços de exibição, a Empresa Cinemas de Santos daria início as obras para a construção de um novo Cine Roxy. Finalizada as obras, o Cine Roxy é reinaugurado em outubro de 1957 com o filme “Ilha dos Trópicos”, dirigido por Robert Rossen e estrelado por James Mason e Joan Fontaine. Totalmente remodelado, o Cine Roxy passa a contar com 1500 confortáveis poltronas instaladas em declive para assegurar a total visibilidade da tela, diga-se de passagem, anunciada como umas das maiores do Brasil. O tratamento acústico da sala também mereceu atenção especial com revestimento de Eucatex e som estereofônico com 4 faixas magnéticas. O aparelho de projeção passa a ser equipado com lentes anamórficas possibilitando ao cinema programar filmes no formato scope.

O cinema era uma das opções prediletas de lazer do público santista e dos turistas que por aqui passavam. A cidade carecia de teatros dificultando a vinda de espetáculos em temporada na capital. Os cine-teatros existentes há muito dedicavam sua programação para as projeções cinematográficas, como pode ser observado no Coliseu, Guarany, D. Pedro II e São José. Há anos a sociedade santista se mobiliza para a construção de um teatro na cidade. Vejamos o anúncio da matéria publicada no dia 10 de janeiro de 1954, no jornal Diário: “Silêncio na Ribalta – Palcos transformam-se em telas. Imperiosa a construção do Municipal”.

Se um teatro municipal seria realidade apenas nos anos 70, a sociedade santista teria sua antiga reivindicação atendida graças a uma iniciativa dos irmãos Luiz, Manuel e Júlio Marcelino, que em janeiro de 1958, inaugurariam o Teatro Independência com a peça “A Compadecida” de Ariano Suassuna. Contudo, os elevados custos para manutenção do espaço físico e dos próprios espetáculos, meses depois transformariam o Independência em um novo cinema.Nossa Cinelândia passaria então a contar com mais uma sala a partir do dia 23 de agosto, com a projeção do filme “Adeus as Armas”, adaptação para as telas do livro homônimo do escritor Ernst Hemingway, dirigido por Charles Vidor, tendo Rock Hudson, Jennifer Jones e Vittorio de Sica no elenco. Tempos depois, o Cine Independência conseguiria com exclusividade os títulos da Fox Film consolidando o espaço como um dos principais lançadores de filmes da cidade.

O último grande investimento da década foi com a reforma interna e externa do já decadente Cine-Teatro Campo Grande. Na tentativa de revitalizar o espaço, a Empresa Cine-Theatral o reinaugura em outubro de 58, agora com o nome de Cine Ouro Verde. Para o novo cinema do bairro do Campo Grande, a Cine-Theatral programou para a abertura um Festival com 7 filmes inéditos em Santos. A sessão inaugural caberia ao filme “A Donzela de Ouro”, tendo como atrativos a atriz Joan Crawford e o ator Rossano Brazzi.

No final dos anos 50, Santos conta com uma população de aproximadamente 260.000 habitantes. O bairro do Gonzaga consagra-se definitivamente como o local predileto dos cinéfilos santistas. Estão em atividades os cines: Atlântico, Avenida, Bandeirantes, Cacique, Caiçara, Carlos Gomes, Coliseu, D. Pedro II, Gonzaga, Guarany, Independência, Iporanga, Marapé, Macuco, Ouro Verde, Paramount, Roxy. Muitas dessas salas, sobretudo as localizadas em bairros, não resistiriam à crise que começava a se configurar no mercado. É o fim do período áureo das salas de cinema em todo o Brasil.

Paulo Renato Alves
Capítulo do Livro História dos Cinemas em Santos
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Crise no Mercado Exibidor: O Fechamento das Salas de Cinema

O mercado de exibição cinematográfica brasileira permanece ainda em expansão no início dos anos 60. Em Santos, se os cinemas de bairro e do Centro davam os primeiros sinais de decadência, a grande freqüência de público mantinha-se nos cinemas do Gonzaga, despertando o interesse de empresários situados em outras cidades. Consagrado como a cinelândia santista, acrescenta-se aos cinemas desse bairro o Praia Palace. A Empresa Paulista de Cinemas Ltda, responsável também por diversas salas em São Paulo e no interior, vislumbra na praça santista uma excelente oportunidade de negócio. Em maio de 1960, a Empresa anuncia maiores detalhes sobre a inauguração da sala e do filme. Para a abertura do novo cinema foi programado o filme “A Ponte do Rio Kwai”, do cineasta David Lean. A sala dispunha de 800 poltronas e um eficiente sistema de projeção que incluía a tela panorâmica e o cinemascope.

Poucos meses depois, seria a vez do Cine Indaiá ser instalado no Gonzaga, no único grande investimento feito por empresários locais em toda a década. Para o lançamento do novo cinema de sua rede, a Empresa Cinemas de Santos Ltda promove um Festival de Filmes, a partir do dia 14 de dezembro. Para a abertura do Festival foi programado o filme “Os Dez Mandamentos”, superprodução da 20 Th Century Fox, dirigido por Cecil B. de Mille e estrelado por Charlton Heston, Yul Brynner, Anne Baxter, Edward G. Robinson, Debra Page e Vincent Price. O Indaiá era mais um cinema construído nos moldes da década anterior, com um total de 1500 poltronas distribuídas entre a platéia inferior e os pullmans.

No ano seguinte, outra empresa cinematográfica insere-se no mercado exibidor santista. A Rede Paulista de Cinemas investe na cidade inaugurando o Cine Alvorada. Para a estréia da nova sala é programado o filme brasileiro “João Negrinho”, dirigido por Oswaldo Consoni. Localizado no bairro Vila Nova, esse cinema logo encerraria suas atividades, sendo reaberto em janeiro de 1962 com o nome de Cine Rádio Cultura, mantendo-se em atividade somente até o mês de julho desse mesmo ano.

Ainda assim, o mercado santista mostrava-se atrativo. Ampliando sua rede de salas, os empresários Lucídio Ceravolo e Lívio Bruni inauguram o Cine Itajubá, em julho de 1963, e dois anos depois com o Cine Glória, ambos situados na orla da praia. O Cine Itajubá, localizado no bairro do José Menino, possuía capacidade para 650 espectadores. O filme “Malhas Negras” do diretor Terence Young, marca o início das atividades nesta sala. Curiosamente, foi neste cinema que ocorreu, segundo os jornais da época, um atentado a bomba em suas dependências, durante a projeção de “Branca de Neve e os Sete Anões”, em 1967. Quanto ao Cine Glória, que juntamente com o Caiçara dividia as honras de exibidor do bairro do Boqueirão, teve sua sessão de estréia com a comédia “Deu a louca no mundo”, de Stanley Krammer, em maio de 1965.

Entre essas duas inaugurações, tivemos ainda a abertura do Cine Brasília, em julho de 1964, no bairro da Ponta da Praia. O proprietário do cinema, mencionado nos jornais da época apenas como Sr. Bonito, realiza seu primeiro e último investimento no ramo exibidor. “Reis do Sol”, exibido simultaneamente com o Cine Iporanga, é o primeiro filme projetado nesta sala. No entanto, a dificuldade em conseguir títulos cinematográficos rentáveis, fez com que esse empresário não demorasse a sair do ramo exibidor, sendo a sala incorporada ao circuito da Empresa Cinemas de Santos Ltda. Re-inaugurada em 1967 por essa empresa, a sala seria a única na cidade com equipamentos para projeção em 70mm. “A Bíblia” de John Huston foi o pioneiro na exibição desse formato.

Depois do Golpe Militar ocorrido em março de 64, a cidade passa por um período de intervenção, sendo nomeado para a Prefeitura o Capitão de Fragata Sr. Fernando Hortala Rinkel. O clima de apreensão aumenta com a chegada do navio presídio Raul Soares, em abril de 1964. Não tardaria para que muitos sindicalistas, estudantes e intelectuais fossem interrogados e presos nas dependências do navio que ficara ancorado no canal Estuário.

Ao mesmo tempo em que a cidade vive um momento difícil de sua história, algumas das tradicionais salas de cinema encerram suas atividades. Os primeiros sinais da crise no mercado santista manifestam-se através do fechamento de uma das mais antigas salas da cidade, o Cine Paramount, em novembro de 1964. Seria o preâmbulo do fim de diversos cinemas na cidade. Em 1966, os jornais anunciariam o fechamento de mais salas. Deixam de existir o Cine Cacique, o Cine Avenida, o Carlos Gomes e o Cine-Teatro D. Pedro II. Para justificar tais medidas, os empresários apontam uma série de fatores, sendo o principal deles o baixo percentual que fica com o exibidor, cerca de 2% da bilheteria auferida. O restante da renda seria absorvido pelas distribuidoras, impostos, direitos autorais, pagamento do complemento nacional e funcionários. As salas situadas na Cinelândia e na praia, detentoras de um maior movimento de público, conseguem-se manter-se, já as localizadas nos bairros e Centro, o prejuízo é inevitável.

No caso do Cine Carlos Gomes, uma comissão formada por moradores do bairro da Vila Mathias solicita a permanência das funções cinematográficas desse tradicional cinema. Para resolver o impasse, a Empresa Santista de Cinemas Ltda transfere o Cine Carlos Gomes da Avenida Ana Costa, 55, para as instalações do Cine Bandeirantes, situado também no bairro de Vila Mathias. Curiosamente, o Carlos Gomes volta ao seu espaço físico do período de sua inauguração na Rua Lucas Fortunato, 29 e o Cine Bandeirantes deixa de existir.

Também em 1966, na cidade do Rio de Janeiro, o empresário Lívio Bruni pede concordata e anuncia o fechamento de dezenas de salas de seu circuito, incluindo 20 situadas em São Paulo. Essa medida, no entanto, não atinge os cinemas de sua propriedade em Santos. Outro grande empresário do ramo, Luiz Severiano Ribeiro, dono de uma das maiores redes de cinema do Brasil, anuncia concordata. A situação dos exibidores em todo o Brasil torna-se cada vez mais delicada.

Para fazer frente à crise, o Sindicato dos Exibidores do Estado de São Paulo inicia um movimento de boicote a qualquer filme cujo valor exigido pela distribuidora ultrapasse 50% da renda líquida. Os proprietários das salas manifestavam-se ainda contrários a prática de negociação de filmes em lotes, já que poucos apresentavam qualidades artísticas e resultados satisfatórios de bilheteria, bem como protestavam contra as cláusulas contratuais que determinavam o tempo de permanência que um filme ficaria em exibição. O primeiro filme a ter uma taxa diferenciada foi “E o vento levou”, exibido durante várias semanas no Cine Roxy e que custou ao cinema o reembolso de 75% da bilheteria auferida. Na época, a distribuidora justificava esse percentual devido ao elevado custo de produção e o tempo do filme, cerca de 220 minutos. Tempos depois, seria o filme “Os Dez Mandamentos”, ser majorado em 70% por sua distribuidora, sob a alegação de se tratar de uma superprodução. Em seguida, manteve-se essa taxa para todo e qualquer filme considerado de boa qualidade artística e potencialmente rentável. Finalmente, ampliaram essa taxa para todos os filmes. Dentro desse contexto, alegavam os empresários, até filmes de grandes bilheterias como “Lawrence da Arábia” e “Deu a louca no mundo”, tornam-se deficitários para os proprietários de cinemas.

Coincide esse período com a popularização dos aparelhos de televisão e a conseqüente queda de público nas salas. Consequentemente, mais duas salas deixam de existir na cidade. O cine Atlântico é entregue para a construção de um prédio no local. Já decadente e não fazendo o papel de lançador de filmes, o primeiro cinema de luxo de Santos encerra suas funções cinematográficas. Depois, é a vez do Marapé tornar-se inviável economicamente e ceder seu espaço para a instalação de um supermercado. A última sala a encerrar suas atividades foi o cine Macuco, outubro de 1968.

O balanço no final da década de 60 apresenta o fechamento de 6 salas localizadas em bairros, 1 no Centro e 1 no Gonzaga. Dos bairros fecharam suas portas os cines Avenida (Campo Grande), Marapé (Marapé), D. Pedro II, Cacique e Macuco (Macuco), Alvorada / Rádio Cultura (Vila Nova), Paramount (Centro) e Atlântico (Gonzaga). Acrescenta-se a esses exibidores o Santos Futebol Clube que desde os anos 50 promovia com regularidade sessões de cinema em suas dependências.

Em contrapartida, a crise no mercado de exibição a produção cinematográfica brasileira conquista grande respeito da crítica internacional. Jovens e promissores cineastas iniciam ou consolidam suas carreiras. O movimento cineclubista espalha-se por todo o País, promovendo a exibição e o debate de filmes que pouco ou nenhum espaço encontravam no circuito comercial. Em nossa cidade, coube ao franco-santista Maurice Legeard capitanear as ações do histórico Clube de Cinema de Santos, criando várias gerações de cinéfilos ao longo dos anos.

Apesar da conturbada situação política, os anos 60 representou alguns pequenos avanços para o cinema brasileiro. Em 1966, por exemplo, foi criado o INC (Instituto Nacional de Cinema) com o objetivo de “formular e executar a política governamental relativa à produção, importação e exibição de filmes, ao desenvolvimento da indústria cinematográfica brasileira, ao seu fomento cultural e à sua promoção no exterior”. Três anos depois, surgiria a Embrafilme que tinha inicialmente a prerrogativa de fazer a “distribuição de filmes brasileiros no exterior, a promoção, a realização de mostras e apresentação em festivais visando a difusão da cinematografia nacional sob aspectos culturais, artísticos e científicos”.

Em que pese tais iniciativas serem também uma tentativa para acalmar os ânimos de nossos jovens cineastas, sem esquecer que considerável parcela deles tem suas histórias escritas nos diversos movimentos universitários da época, a criação do INC e posteriormente da Embrafilme, denotam a inclusão da produção cinematográfica na agenda política governamental. O recrudescimento político chega ao seu auge com a promulgação do AI 5, em dezembro de 1968. Os direitos humanos desrespeitados, os direitos políticos tolhidos.

A conseqüência em nossa cidade foi nefasta. A eleição feita um mês antes da instalação do AI 5 teve como vitorioso Esmeraldo Tarquínio, candidato do MDB, partido de oposição aos militares. Em março de 1969, o Governo Costa e Silva cassa o mandato de Esmeraldo Tarquínio. Diante desse quadro sombrio, o Vice-Prefeito Oswaldo Justo renuncia. Em abril, a cidade é transformada em área de segurança nacional, para em seguida ser governada por mais um interventor, o general Clóvis Bandeira Brasil. Os anos 60 findam levando consigo as aspirações democráticas da população santista.

Capítulo do livro História dos Cinemas em Santos
Postado em 12 de novembro de 2008

Paulo Renato Alves

Anos 70: Os cinemas de arte e o fim dos cinemas de bairros

No final dos anos 60, já era possível observar uma mudança de hábito do público residente nos bairros, que não mais esperavam a exibição de um filme nas decadentes salas de sua vizinhança e convergiam para os cinemas do Gonzaga e do Boqueirão. Seja para os santistas ou para os turistas que lotam os hotéis e apartamentos de temporada, a Cinelândia e os cinemas do Boqueirão apresentavam-se como uma das poucas opções de lazer além da praia e do banho de mar. Contudo, todos esses ventos favoráveis não davam aos empresários cinematográficos santistas a garantia de grandes bilheterias. A escassez de títulos em lançamento obrigava-os muitas vezes a prolongarem a permanência de um filme em cartaz, quando não reprogramavam um ou outro título saído recentemente do circuito, reduzindo inevitavelmente o número de espectadores.

Se não bastassem os problemas do próprio mercado, o chamado “milagre econômico” foi fator definitivo para a popularização dos aparelhos de televisão em todo o País. O cinema passa a concorrer com a novela, com os programas de auditórios ou mesmo com os próprios filmes exibidos na telinha. Como veremos, muitas foram as tentativas para driblar a crise. O Grupo Nacional de Diversões Ltda, por exemplo, inaugura no Rio de Janeiro uma sala onde o cardápio da programação cinematográfica tem como prato principal os filmes consagrados pela crítica e de reconhecido valor artístico.

O êxito e a repercussão dessa iniciativa logo chegariam a Santos. Com isso, as empresas Cine-Theatral e Cinemas de Santos entram em contato com o Grupo Nacional de Diversões Ltda para a implantação de uma sala com o mesmo conceito em nossa cidade. O Cine Glória, então administrado por essas duas empresas, seria reformado e reaberto com o nome de Cinema 1, reproduzindo o perfil cinematográfico da sala carioca. A inauguração do primeiro cinema de arte santista aconteceria em fevereiro de 1973, com a exibição do filme italiano “A classe operária vai ao paraíso”, do diretor Elio Petri.

Não poderia passar despercebida a atuação dos cineclubes e cinematecas em todo o Brasil. Além de contribuírem para o surgimento de jovens cineastas, foram responsáveis também pela formação de várias gerações de cinéfilos, que ao longo do tempo possibilitariam a implantação de cinemas com esse perfil de programação. Em Santos, o Cinema 1 surge voltado para esse público, forjado nos anos 50 e 60 nas muitas sessões e palestras promovidas pelo Clube de Cinema.

Outra medida adotada pelos exibidores foi a de subdividirem suas salas. Já não se fazia mais necessário um mesmo exibidor ter diversos cinemas com grande capacidade de público, já que poucos eram os títulos que proporcionavam sua lotação. Com a subdivisão das salas poderiam projetar mais filmes, alcançando uma diversidade maior de segmentos de público. No caso de São Paulo, o Cine Trianon é reformado dando origem as 6 salas do HSBC Belas Artes. Outras grandes salas como o Marrocos, Normandie, Art Palácio e Ipiranga, adaptam suas instalações e transformam seus gigantes espaços em duas salas.

Seguindo a mesma estratégia, os empresários santistas adaptam suas salas a nova realidade do mercado. O Cine Gonzaga é fechado para reformas em 1975, reabrindo em 12 de agosto do ano seguinte como Stúdio Atlântico 1 e Stúdio Atlântico 2, ambos em parceria com a Empresa Cinematográfica Hawai Ltda. No novo projeto arquitetônico, a platéia do antigo Cine Gonzaga foi transformada no Stúdio Atlântico 1, enquanto o seu balcão foi transformado no Stúdio Atlântico 2. A inauguração das novas salas contou com a presença de Oswaldo Massaini, renomado produtor do cinema brasileiro. Após o coquetel, realizou-se a projeção do filme “O Velho Fuzil”, do diretor francês Robert Enrico, que permaneceria em cartaz no Stúdio Atlântico 2, sala que disponibilizaria 430 novas poltronas na cidade. Um pouco maior o Stúdio Atlântico 1, tinha capacidade para receber 513 pessoas, projetando em sua estréia o filme “Shampoo”, do diretor americano Hal Ashby.

Em outubro de 1979, seria a vez do Cine Indaiá e do Cine Iporanga reduzirem seus espaços. Do antigo pullman do Indaiá surge o Indaiá-Arte com capacidade para 272 espectadores. Para a sua abertura é programado o filme “O Ovo da Serpente” de Ingmar Bergman. Após a reforma o Cine Indaiá passa a contar com um total de 902 poltronas sendo reinaugurado com o filme “Pretty Baby” de Louis Malle.

Reaproveitando também o seu antigo pullman, a empresa Cine Theatral inaugura o Iporanga 2. A nova sala do Gonzaga abre suas portas com a projeção do filme “Um casal perfeito” de Robert Altman, lotando suas 550 poltronas. Tendo como proposta de programação a exibição de filmes românticos e comédias, é a terceira sala do complexo Iporanga, que já possuía em funcionamento as salas 1 e 3.

Trata-se, contudo, de mais uma tentativa do exibidor santista se adaptar a nova realidade de mercado. Além de subdividirem suas grandes salas, os empresários santistas fecharam as quatro últimas salas de bairro existentes, bem como construíram poucos e menores cinemas quando comparados aos de décadas anteriores. Tentando ainda equilibrar suas contas, a empresa Cine Theatral reforma o Iporanga 1 possibilitando que o espaço além de manter suas funções cinematográficas possa receber também shows musicais e pequenos espetáculos teatrais.

Em janeiro de 1975, o Iporanga Music Hall é solenemente inaugurado com um show da cantora Maria Bethânia acompanhada do grupo Terra Trio. No decorrer desse ano, o local receberia diversas outras apresentações como o da dupla Toquinho e Vinícius, e dos humoristas Chico Anísio e Juca Chaves. No entanto, os altos custos dos cachês logo inviabilizariam a proposta e o Iporanga volta a ser exclusivamente cinema.

Em outubro do mesmo ano, a Cinemas de Santos Ltda fecha contrato desta vez com exclusividade para distribuir todos os filmes da Empresa Cinematográfica Hawai Ltda na cidade. Marcaria o início da parceria a exibição dos seguintes títulos: “O Poderoso Chefão 2”; “Inferno Na Torre”; “O Que Você Sempre Quis Saber Sobre Sexo – Mas Tinha Medo De Perguntar”; “O Jovem Frankstein”; “O Casal”; “O Roubo Das Calcinhas”; “O Seqüestro Do Metrô”; “ Funny Lady”; “Os Homens Violentos De Klan”; e “Esposa Comprada”.

Novos Cinemas

Se as salas do Centro e dos bairros permaneciam deficitárias, os cinemas do Gonzaga voltavam a receber um grande público. De 1974 a 1976 foram lançados os filmes “O Exorcista”, “Inferno na Torre”, “Tubarão” e “Dona Flor e seus dois maridos”, todos com grandes bilheterias, gerando o capital necessário para que as empresas santistas realizassem mais quatro novos empreendimentos.

Somente em 1976, surgem os cines Júlio Dantas, Iporanga 3, Alhambra. O primeiro ocupou o espaço do antigo Cine Theatro Centro Português, no Centro da cidade. Em 15 de abril, abriria suas portas com a projeção de um filme religioso “Nascimento, Vida, Paixão e Morte de Nosso Senhor Jesus Cristo” e um de lutas marciais “Kato – O Dragão Invencível”, estrelado por Bruce Lee, artista falecido meses antes. Passado algum tempo, a sala mudaria seu perfil de programação exibindo basicamente filmes pornôs.

Logo depois, em maio, o Gonzaga teria mais uma sala de cinema. O Iporanga 3 debuta para o público santista com o filme “Esse crime chamado justiça”, trazendo Vittorio Gassman e Ugo Tognazi no elenco, e Dino Risi na direção. Com suas 180 poltronas, o Iporanga 3 foi instalado no andar superior do Cine Iporanga, onde antes funcionava a sede do Elos Clube. Nesse mesmo andar, tínhamos ainda em atividades um Pub e uma Discoteca.

Em setembro, seria inaugurada uma das mais charmosas salas de cinema de Santos, o Cine Alhambra. Instalado na Rua José Caballero, onde antes era o auditório da Rádio Clube de Santos, a sala contava com 450 lugares, iniciando suas atividades no dia 2 de setembro com a projeção do filme “Xica da Silva”, de Cacá Diegues. Para a solenidade de abertura, a Cine Theatral convidou o próprio diretor do filme, bem como os atores principais do elenco, onde figuravam nomes como Zezé Mota, José Wilker, Walmor Chagas, Elke Maravilha e Altair Lima.

Na geografia cinematográfica santista, o Centro da cidade acabou concentrando a maioria das salas exibidoras de filmes pornôs. Integram o circuito exibidor dessa região os cines Coliseu, Guarany, Júlio Dantas, e o Cine Teatro Fugitive, instalado em boate do mesmo nome, a partir de 1978. Fora da região central da cidade, e sob muitos protestos da vizinhança, dedicam-se a projeção de filmes pornográficos os cines Praia Palace e Itajubá.

Por outro lado, no Gonzaga e Boqueirão, os cines Stúdio Atlântico 1 e 2, Iporanga 1,2 e 3, Indaiá e Indaiá-Arte, Roxy e Alhambra, Caiçara e Cinema 1, seja em função de suas dimensões físicas ou dos segmentos de público que objetivam alcançar, apresentam em suas programações filmes dos demais gêneros cinematográficos. São salas modernas, confortáveis, com boa qualidade projeção, sonorização e manutenção do espaço.

O Fim dos cinemas de bairro

A baixa freqüência de público, os elevados gastos com funcionários e impostos, a baixa lucratividade do negócio, e a especulação imobiliária, seriam fundamentais para o fechamento de diversos cinemas no decorrer da década. As situadas em bairros são as que mais sentem o impacto. O primeiro a encerrar suas atividades é o Cine São José, em agosto de 1975, com o filme italiano “Popéia – A Serviço do Império”. Lembrado principalmente por ser lançador de filmes japoneses nos anos 60, a cidade perde seu maior cinema em atividade.

No ano seguinte, seria a vez do cine Carlos Gomes deixar em definitivo o circuito exibidor. Domingo, 6 de julho, o filme “O Massacre” com Richard Burton e Irene Papas, faria as últimas sessões do único cinema remanescente do bairro de Vila Mathias. Desta vez, sem choro, nem vela dos moradores do bairro, o cine Carlos Gomes deixa de existir cedendo seu espaço para um estabelecimento comercial.

Para a tristeza dos moradores do bairro do Campo Grande e adjacências, o próximo cinema a fechar suas portas seria o cine Ouro Verde, em 11 de setembro de 1977. Trata-se de mais um cinema construído para atender grandes demandas de público, inviável economicamente para os padrões e necessidades da época. Assistido por 538 pessoas em suas 4 derradeiras projeções “Jecão – Um fofoqueiro no céu”, de Amácio Mazzaropi, marca a despedida da sala.

Resistiria apenas o Cine Brasília, que dois anos depois seria vendido e transformado em supermercado. Para a cidade, uma tristeza; para os empresários, um alívio. “O céu pode esperar” de Warren Beatty, exibido nos primeiros dias de julho é o último filme a ser projetado nas telas de um cinema de bairro em Santos. Era o fim de um período.

Contexto Geral

Muitos foram as dificuldades enfrentadas pelos exibidores durante toda a década. A reserva de mercado para o filme nacional seria instituída nesse período, acumulando grandes prejuízos aos empresários. Se “Dona Flor e Seus Dois Maridos”, “Lúcio Flávio – O Passageiro da Agonia”, e as comédias dos Trapalhões faziam filas nas bilheterias o mesmo não se podia dizer de dezenas de outros títulos, realizados com orçamentos reduzidos e de qualidades duvidosas.

Outra queixa constante dos exibidores era referente às relações estabelecidas com as distribuidoras. Embora a lei determinasse um prazo de 60 dias para o pagamento de um filme, as distribuidoras exigiam o montante após 30 dias da saída do filme de cartaz. Não sendo efetuado o pagamento, mobilizavam a Associação Brasileira de Cinema (ABC), que intervinha junto a todas as outras distribuidoras para que nenhum filme fosse liberado ao exibidor inadimplente.

A censura exercida por militares profissionalizados mediante cursos específicos atuava nas redações de jornais e revistas, emissoras de rádio e televisão, universidades, e na produção artística e intelectual do País. No cinema, filmes como o edipiano “La Luna” de Bernardo Bertolucci ou o anarquista Sacco e Vanzetti”, de Giuliano Montaldo, seriam liberados para exibição alguns anos depois de seus lançamentos. Aos exibidores e distribuidores, resta lamentar a falta de critério e a arbitrariedade dos censores.

Fim dos anos 70 a cidade continua enquadrada como área de segurança nacional tendo seus administradores nomeados por militares. Ao todo um militar e três civis comandaram a Prefeitura até a reconquista da autonomia política na década seguinte. No cenário nacional, ativistas de esquerda já haviam sido contidos, o mesmo não podendo se falar dos grupos paramilitares e dos aparelhos repressivos do Estado. A Lei da Anistia dava os primeiros passos para o retorno de exilados políticos. Em breve, mais um capítulo de nossa história política estaria terminado.
1 - Comando de Caça aos Comunistas (C.C.C.) e Aliança Anticomunista Brasileira
2 - DOI-CODI e Forças Armadas

Paulo Renato Alves

Capítulo do Livro História dos Cinemas em Santos
Publicado originalmente em 21 de novembro de 2008